Estava aqui no computador, conversando comigo mesma no meu querido e amado blog, ontem de manhã, quando o Chico se aproximou para se despedir e disse:
– Estamos meio esgotados da correria da semana, né? Acho que merecemos jantar fora hoje. Vamos ao Lorita?
– Eba! Siiim!
ADORO O LORITA!
Casamento tem suas peculiaridades e uma das mais lindas, na minha opinião, é a percepção que desenvolvemos de prestar atenção no outro. Sim, andamos meio esgotados – e um jantarzinho fora para desopilar tinha todos os ingredientes para tornar-se um sopro de leveza no cotidiano. Mas casamento também significa compreender melhor como funciona a cabeça do outro, seu ritmo, seus modos e manias. E eu tinha certeza que, no meio da tarde, nós dois já estaríamos pensando que o melhor mesmo era fazer uma jantinha em casa, o que não significava um programinha menos nobre. Apenas com troca de endereço.
Era por volta de 5h da tarde quando meu celular tocou. Chico chamando.
– O que tu acha da gente fazer uma coisinha em casa em vez de sair? – ele perguntou.
Bingo!
– Acho ótimo.
– Vamos fazer um churrasquinho na grelha?
– Siiiiim!
– Eu passo no super e estarei em casa com o cara te esperando.
Casamento também significa antecipar ações que o outro fará. Por exemplo: saber que ele mandará um torpedo do meio do supermercado perguntando alguma coisa, qualquer coisa que seja. Dito e feito. Cerca de 40 minutos depois, meu SMS soou.
– Filé bovino ou lombo suíno?
Casamento significa ainda saber qual é a resposta que o outro quer que a gente dê, embora, muitas vezes, não seja exatamente a resposta que gostaríamos de dar. Chico (e eu tinha certeza disso) queria que eu escrevesse de volta “lombo suíno”. Mas eu andava havia alguns dias salivando por um filé bovino mal passado e quis que fosse feita a minha vontade.
– Filééé!! Compra umas batatas doces também pra gente fazer no forno com páprica! – pedi.
Mas casamento também significa que nem sempre todos os nossos desejos são atendidos.
ELE COMPROU CARÁ EM VEZ DE BATATA DOCE
Eu nunca tinha ouvido falar em cará. Cheguei em casa e, enquanto ele preparava o filezinho na grelha, perguntei onde estavam as batatas doces para fazer com páprica no forno.
LEMBRAM DA RECEITA COM BATATA ROSA?
– Pois é. Vi esse troço e achei bonito. Achei até que fosse batata doce. Mas, quando fui pesar, apareceu cará na etiqueta – ele disse.
– Hummm… – resmunguei olhando para aquele troço com aparência de granito e duro feito pedra.
– Bonito, né? – ele quis saber.
– Ahã. E como se faz isso?
– Não sei.
Peguei a faca mais afiada que tinha na gaveta e me coloquei a descascar o tal do cará. Depois, me atraquei com as duas mãos e o peso do corpo a tentar cortá-lo em fatias, feito tiras de batata. Sim, eu poderia ter ido consultar o senhor Google para saber exatamente do que se tratava, desculpando-me pela minha ignorância e procurando uma receitinha de fácil execução. Mas eu tinha passado o dia na frente do computador e tudo o que mais desejava era não ver aquela luz branca desgraçada na minha frente tão cedo.
SÓ QUERIA COMER BATATA DOCE COM PÁPRICA
O tal do cará começou a soltar um líquido gosmento, meus dedos começaram a ficar pegajosos como se tivesse passado um bastão de cola Tenaz. Comecei a ficar um pouco incomodada, montada em cima da faca em cima do cará no balcão da cozinha e com melequice pra tudo quanto era lado.
– Olha a meleca que solta esse cará – mostrei para o Chico meus dedinhos grudentos quase enconstando no nariz dele.
– Abandona esse troço então.
Guardei minha obra de arte de cará cortado em tiras na geladeira e fui sorver meu cálice de vinho. Jantamos filé mal passado com cebola e tomate, dormi sem ter feito a digestão direito e por volta daquele horário que tenho costumado acordar…. Entre 3h e 4h da manhã….
Plim!!!
TIVE INSÔNIA DE NOVO
Estava com preguiça de levantar, estava com preguiça de ler e fiquei uma hora rolando na cama e pensando no tal do cará. Não, eu não tinha nada mais útil pra pensar, apenas o fato de não saber para que serve um troço chamado cará. Pensamentos, claro, acompanhados da sinfonia de roncos do animal. Sim, porque o animal, como não se preocupa com nada e muito menos com cará, dormia de pelotas e roncava a plenos pulmões.
Ponderei, então, que não valia a pena perder meu sono por causa de um cará e fui pesquisar que raio é isso.
MUITO PRAZER!
SOMOS UMA TURMA DE CARÁS
Pesquisa daqui, pesquisa dali, descobri um certo parentesco de cará com inhame – o querido inhame que faz parte do trio da serotonina boa!
O cará, o inhame e outras raízes nunca foram bem identificados. A confusão é antiga e começou com Pero Vaz de Caminha, na carta enviada ao rei de Portugal a respeito do descobrimento do Brasil. Ele errou ao registrar o que os índios comiam. Trocou a mandioca, principal alimento dos tupiniquins, pelo inhame.
– Muito inhame e outras sementes que na terra há e eles comem – escreveu.
Porém, o equívoco maior é entre o inhame e o cará, que é um tubérculo. Em certos lugares os nomes são até trocados. No Nordeste, por exemplo, o cará é chamado de inhame. Em outras regiões, o cará é chamado de inhame-cará. Os dois têm muita coisa em comum, como o valor nutritivo, a origem tropical, o gosto por clima quente e úmido, com bom índice de chuvas. Porém, existem diferenças apontadas pela Embrapa Hortaliças.
O inhame é da família das aráceas e seu rizoma tem forma arredondada, é peludo e de ponta afilada. Apresenta alto teor de açúcar. A planta tem aparência de uma folhagem de jardim e as folhas largas em forma de coração. Já o cará é da família das dioscoreáceas. O tubérculo é comprido, como a batata-doce, e tem pêlos ralos. O teor de açúcar é menor que o do inhame. A planta solta folhas pequenas e parecidas com as da batata-doce.
E O XERIFE É QUE MANDA
Mari, adorei os teus comentários sobre o casamento e concordo com todos!
Mas tu me deixou muito curiosa sobre o tal cará e fui atrás de umas receitas. Achei essa aqui que parece ser uma variação da batata no forno com páprica (e deve ficar super gostoso!) Só trocaria a mateiga por azeite de oliva…
Batata doce, batata roxa, mandioca, inhame, cará. Não se deve abusar desses ingredientes pouco frugais, mas dá para fazer muita sopa, purê, massas, cremes e, para quem peca, até eventuais friturinhas, de preferência com óleo de canola. Esquenta o frio e a alma!
Ingredientes
1 unidade cará grande (cerca de 600 g)
60g de manteiga
2 colheres (de sobremesa) de sobremesa de ervas picadas (salsa, tomilho, cebolinha)
sal a gosto
Modo de preparo
Embrulhe o cará com a casca no papel-alumínio e asse em forno a 250ºC por uma hora. Derreta a manteiga em fogo baixo, adicione as ervas e mexa até que comece a escurecer. Desligue o fogo, junte o sal. Desembrulhe o cará, coloque-o numa tábua, parta ao meio no comprimento. Faça alguns rasgos com a faca e regue com a manteiga de ervas. Sirva como acompanhamento.
Eba, Any! Super!! Bjo. MK
Mariana, cará tbem fica muito bom gratinado com ervas finas e azeite de oliva. Fica bem croc-croc! Aposto que até o Bento vai adorar… bjoks