Não basta apenas vestir a camisa

Acabo de chegar da casa do pai e da mãe. Muitos e muitos amigos se reuniram pra ver o jogo do Brasil x Croácia e, claro, o convite foi estendido a mim e ao animal. Mas, fazia alguns dias, não desfrutávamos da companhia de mama e baba e nada poderia vir mais a calhar do que uma quinta-feira livre às 5h da tarde para comer pipoca na companhia de quem mais nos quer bem.

fathers-loveCARINHO DE PAIS

Confesso que nunca fui e continuo não sendo uma entusiasta de Copa do Mundo. Nem na China e muito menos no Brasil. Não acho que estaríamos menos mobilizados se essa Copa fosse do outro lado do mundo. A paralização do país seria a mesma, como sempre foi. Sim, esse dinheiro que foi gasto para concretizar a Copa poderia ter sido gasto em hospitais e escolas padrão Fifa. Mas tenho certeza que, não existindo a Copa no Brasil, jamais saberíamos que existia a cor desse dinheiro. Ou seja: com Copa ou sem Copa não veríamos escolas e hospitais padrão Fifa. Hoje, vemos estádios. Sem Copa aqui, nem isso veríamos.

bento1ELA É BASTANTE CÉTICA

Eu não sou cética. Sou realista e compartilho da opinião do ex-ministro Rubens Ricupero de que vivemos em um país de corrupção endêmica. Eu não acredito que um dia o Brasil se tornará um exemplo de país desenvolvido e honesto. Estamos fadados a ser um país de terceiro mundo e subdesenvolvido e lamento demais por isso. Mas, enfim, falo do fundo do coração. Não temos educação suficiente para oferecer aos cidadãos a noção de cidadania e aí é que a coisa já começa toda torta.

HS2598BASTANTE TORTA

Eu fui assistir ao jogo hoje mais pela vontade de estar entre pai e mãe comendo pipoca do que pelo jogo em si. Mas então a Seleção entrou em campo. E então, tocou o hino. E então o hino foi suspenso e a torcida e os jogadores seguiram cantando. E então eu vi David Luis, Julio Cesar, Tiago Silva e minha mãe com os olhos cheios de lágrimas. E então eu fiquei fula da vida quando a TV mostrou a presidente Dilma no palanque vestida de verde. E estão eu pensei comigo: “Está vendo? Está vendo? Está vendo que lindo esse povo? Está vendo que lindo esse povo e que carinho e amor ele tem pelo seu país? E é justo a falta de segurança que vivemos, a falta de saúde, educação, mobilidade urbana, segurança?”Não, não é justo. Se culpei a presidente Dilma? Não, não culpei. Culpei, sim, a cada um de nós, que não recorda em que votou para deputado, vereador, senador e, quiçá, presidente.

Ahhhhhhh!!A CULPA É NOSSA, MARIANA?

Em termos. Não somos culpados, obviamente, pela falta de ética e honestidade dos políticos. Mas somos culpados, sim, de não nos engajarmos e levarmos tão a sério uma eleição como levamos uma Copa do Mundo. A escalação das pessoas que vão decidir nossas vidas começa em outubro e essas pessoas vão decidir nossas vidas pelos próximos 4 anos. Gostaria que esse engajamento fosse pelo menos semelhante à torcida que faremos pela Seleção em apenas 7 jogos. Fora isso, meu vinho está ótimo.

Pulenta_Estate_MalbecLOVE U, PULENTA

De resto, era isso. Queria desabafar o que passa na minha cabeça e no meu coração. Queria ter mais orgulho do que tenho de ser brasileira. Queria que esse otimismo ao ver Neymar batendo um pênalti não terminasse com o fim da Copa do Mundo. Queria que o Brasil acreditasse que podemos ser mais e melhor e que o início dessa transformação em mais e melhor começa nas urnas e na cobrança de cada um sobre aquele líder em quem votou.

Sempre lembro de uma provocação de um grande amigo, Leonardo Lamachia, advogado. Falávamos de política e tal e ele largou.
– Quem aqui nesta sala lembra em quem votou para deputado estadual, federal e senador?”
A sala ficou em silêncio – e, então, alguém respondeu.
– Acho que ninguém lembra. Tu lembra, Lamachia?
E ele:
– Não só lembro, como tenho o email de cada um e cobro as promessas de campanha toda a semana.

Aquilo pra mim fez todo o sentido: cidadania. Isso é cidadania. Cantar o hino nacional em um estádio, fantasiado de verde e amarelo não é cidadania. Cidadania é o que seremos capazes de fazer e cobrar quando a Copa acabar.

neymar-0aE QUE SEJA UM GOL LINDO COMO O TEU, NEYMAR

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Mari Kalil

Mari Kalil

Sou escritora, jornalista, colunista da Band TV e Band News FM e autora dos livros "Peregrina de araque", "Vida peregrina" e "Tudo tem uma primeira vez". Sou gaúcha, nasci em Porto Alegre, vivo em Porto Alegre, mas com os olhos voltados para o mundo. Já morei em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Barcelona. Já fui repórter, editora, colunista. Trabalhei nos jornais Zero Hora, O Estado de S.Paulo e Jornal do Brasil; nas revistas Época e IstoÉ e fui correspondente da BBC na Espanha, onde cursei pós-graduação em roteiro, edição e direção de cinema na Escuela Superior de Imagen y Diseño de Barcelona. O blog Mari Kalil Por Aí é direcionado a todas as mulheres que, como eu, querem descomplicar a vida e ficar por dentro de tudo aquilo que possa trazer bem-estar, felicidade e paz interior. É para se divertir, para entender de moda, de beleza, para conhecer lugares, deliciar-se com boa gastronomia, mas, acima de tudo, para valorizar as pequenas grandes coisas que estão disponíveis ao redor: as coisas simples e boas.

Sem comentários ainda.
  1. Bravo! Somos mais engajados no futebol, moda, ou qualquer outro interesse, do que na política, que tem tamanha influência nas nossas vidas, e nós não percebemos.
    Só não concordo qd dizes que o Brasil sempre será assim. Sou uma otimista, penso que quando usas um espaço como este pra nos chamar à reflexão é que alguma coisa já está mudando.
    Bjs

  2. É isso mesmo Mariana, concordo com o que tu falou, também devemos nos responsabilizar pelo o que acontece em nosso país, que sejamos mais conscientes quando irmos as urnas, que possamos ir preparados. É fácil ir ao estádio cantar o Hino e gritar sou brasileiro ou mesmo vaiar e xingar a presidente, o “difícil” é ser honesto, educado e mostrar civilidade em todas as nossas atitudes do dia a dia e isso independe de classe social, infelizmente muitos de nós brasileiros estamos enrustidos de bom caratismo, pois na primeira chance de fazer algo errado para se dar bem não perdemos a oportunidade. Também acho que não seremos um país sem corrupção e desenvolvido, infelizmente. Um dos meus desejos é que assim como no futebol, que somos tão enfáticos, que sejamos também em fazer a diferença, em fazer o bem para o meio em que vivemos, que façamos a nossa parte em nossa sociedade.

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