Para resolver a falta de tempo, é preciso pensar diferente

Sempre termino o domingo meio aborrecida. Não só pelas camisas esdrúxulas do Faustão e pela perspectiva da segunda-feira, que abomino, como pela sensação de deveres (e direitos) não cumpridos. Eu sempre queria ter feito muito no fim de semana e sempre tenho a sensação de não ter feito quase nada. Pelo menos comigo é assim.

Conversando dia desses com minha queria tia Chris, ela comentou sobre uma crônica que escrevi no meu segundo livro Vida Peregrina a respeito de querer fazer tudo e acabar não fazendo nada no sábado de manhã. Reproduzo o capítulo – quem não quiser ler, ou já tiver lido, pode pular toda essa parte em grifo logo abaixo. Não vou ficar chateada.

woman-looking-crazy-feature-280x1253PROMETO

Se me perguntarem qual é o dia da semana que eu mais gosto, eu responderei no ato, sem pensar nem pestanejar: sábado (de folga, claro). Sábado de manhã mais precisamente falando, pois o fim de semana está apenas começando e a sombra horrorosa do domingo à noite ainda é apenas isso: uma sombra horrorosa no horizonte. Todo final de sexta-feira eu faço planos para a manhã do meu sábado. Tenho planos mil de concretizar tudo aquilo que a semana não me permitiu. É aí que mora o problema. Nunca sei por onde começar a colocar meus planos em prática.

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Sábado é dia de tomar café da manhã sem atropelos, depois passear com o Bento sem pressa. Também é dia de ir ao salão, porque sábado é dia de fazer a mão, de fazer hidratação, de fazer depilação. É dia de almoçar fora, ou quem sabe fazer um churrasquinho em casa, aproveitando o sol que entra pela varanda. Pode ser também dia de almoçar com a mãe e o pai, já que passamos a semana sem tempo de nos ver, ou de aceitar o convite dos sogros para um almoço em algum lugar. Então, o sábado começa a ficar tumultuado. Em vez de acordar feliz com a perspectiva de um dia livre, leve e solto, eu já acordo tensa. E começo a fazer contas.

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O passeio com o Bento vai durar uma hora. É o tempo que eu deveria correr na esteira. Mas como já vou ter caminhado com ele durante uma hora, vou usar esse tempo que correria na esteira para ir ao salão. Mas eu não marquei hora no salão, portanto, se eu não for cedo ao salão, não vou conseguir horário para fazer a mão ou alguma hidratação no cabelo. Mas seu eu for cedo ao salão, vou ter que passear menos tempo com o Bento e estarei frustrando meu cachorro do esperado passeio de fim de semana. Além disso, se eu for cedo ao salão, não vou poder fazer o que mais gosto, que é acordar sem despertador, tomar meu café com calma e ler o jornal no sol. Só que, se eu tomar o café com calma depois de acordar sem despertador, não vou ter fome para o almoço na mãe ou na minha sogra – e odeio sentar para almoçar sem fome.

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Essa contabilidade de tempo vai dando um nó no meu cérebro e resolvo molhar as plantas enquanto continuo tentando encontrar horário para tudo. Talvez o mais lógico fosse passear com o Bento e aproveitar a caminhada para passar na farmácia e reabastecer minha farmacinha (fico nervosa se ela não está completa). Durante o passeio, aproveito para marcar a hora no salão por volta de meio-dia e pouco, já que é um horário em que as pessoas costumam almoçar e certamente conseguirei algum encaixe. O problema é que, se eu for ao salão por volta de 1h da tarde, vou terminar lá pelas 2h e pouco. Provavelmente, ligarão convidando para almoçar quando eu estiver com a cabeça molhada na pia. O melhor talvez seja esquecer o salão de vez e fazer aqueles exames de sangue que estão há meses para serem feitos. Só que tomei café, precisava estar em jejum. Esquece. Vou ao supermercado, é isso!

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Nunca tenho tempo de ir ao supermercado com calma. Posso aproveitar e folhear aquele livro de receitas de wok que comprei quatro anos atrás, buscar alguma receita bacana e comprar os ingredientes para fazer algum prato especial no fim de semana na panela de wok que comprei junto com o livro de receitas quatro anos atrás e que nunca usei. Ou então compro só o básico mesmo e aproveito para levar a pilha de roupas que separei para o conserto. Tem também duas botas que eu preciso levar no sapateiro para mandar arrumar o salto. E tem também a penteadeira que eu vi em uma revista e que me disseram que encontraria modelo bem parecido em um galpão de uma loja lá perto da rodoviária. Wok, costureira, sapateiro ou penteadeira? Só dá tempo pra um dos quatro. À essa altura, meu cérebro já deu um nó cego.

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Estou imobilizada no meio da varanda de casa com o regador em punho sem saber para que lado ir – e acabo usando o turno preferido do meu dia preferido para não fazer nada e não ir a lugar algum.

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COM UM NÓ NA CABEÇA

Minha irmã diz que o segredo para não terminar o fim de semana decepcionada com tudo o que queríamos e não conseguimos realizar é ser um pouco mais comedida nos planos. É querer fazer UMA, apenas UMA coisa bem feita – e estar por inteiro nela. Acho que Lulu tem razão. É planejar UM passeio de bicicleta, ou UM almoço em família, ou UM dia dedicado ao esporte, ou UM dia sem planos alguns. Mas UMA coisa de cada vez. Lulu conta que, desde que começou a agir assim, perdeu aquela ansiedade de acordar querendo fazer tudo e acabar não fazendo nada.

enxaqueca21TIPO EU

Há uma jornalista e estudiosa do comportamento feminino de quem gosto muito e leio bastante chamada Cynthia Almeida. Guardei uma coluna que ela escreveu na revista Claudia intitulada “O Tempo a seu Favor”. Ela cita uma pesquisa recente sobre qualidade de vida que trouxe um dado alarmante. Perguntadas sobre como definiriam seu nível de stress, 40% das entrevistadas assinalaram “a ponto de explodir”. Detalhe: eram inglesas de classe média e moradoras de cidades civilizadamente organizadas.

woman-feel-irritatedO QUE SOBRA PRA NÓS?

A conclusão é meio óbvia: não existe lugar no mundo em que as mulheres estejam a salvo da sensação de falta de tempo – o que faz com que me sinta um pouco menos sozinha nesse sentimento de coração apertado. Escreve Cyntha: “A questão do tempo, ou a falta dele, aparece (na pesquisa) como condição inegociável da vida moderna”.

Cynthia cita uma conversa que teve com uma estudiosa neste assunto, a educadora, filósofa e coach Dulce Magalhães (autora, entre outros, dos livros Superdicas para Administrar o Tempo e Aproveitar Melhor a Vida).

images.livrariasaraiva.com.brVOU COMPRAR JÁ

Dulce afirma que para resolver o problema do tempo, temos que pensar diferente – e há três primeiros passos para começar.
1) Garanta um tempo livre todos os dias (mesmo que só 15 minutos).
2) Eleja prioridades (olha o ensinamento da Lulu aí!). Pergunte, ao planejar o seu dia, o que fará diferença no plano pessoal e profissional e, então, concentre esforços. Temos uma determinada quantidade de energia diária para aplicar na vida. Precisamos saber onde colocá-la.
3) Aprenda a dizer não para o que não quer (mas acaba aceitando fazer) e sim para o que quer (aliás, sobre este tema do “aprender a dizer não” há todo um capítulo no meu novo livro Tudo tem uma Primeira Vez).

manaELA ESCREVE E NÃO APLICA

Não é beeem assim. É que nem sempre a gente pode fazer/dizer aquilo que realmente gostaria. Por exemplo: imaginem eu dizendo para o animal neste exato momento que prefiro me trancar em silêncio no meu quartinho de ioga para meditar e ficar sozinha em vez de sair para passear. Conseguem imaginar?

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Mari Kalil

Mari Kalil

Sou escritora, jornalista, colunista da Band TV e Band News FM e autora dos livros "Peregrina de araque", "Vida peregrina" e "Tudo tem uma primeira vez". Sou gaúcha, nasci em Porto Alegre, vivo em Porto Alegre, mas com os olhos voltados para o mundo. Já morei em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Barcelona. Já fui repórter, editora, colunista. Trabalhei nos jornais Zero Hora, O Estado de S.Paulo e Jornal do Brasil; nas revistas Época e IstoÉ e fui correspondente da BBC na Espanha, onde cursei pós-graduação em roteiro, edição e direção de cinema na Escuela Superior de Imagen y Diseño de Barcelona. O blog Mari Kalil Por Aí é direcionado a todas as mulheres que, como eu, querem descomplicar a vida e ficar por dentro de tudo aquilo que possa trazer bem-estar, felicidade e paz interior. É para se divertir, para entender de moda, de beleza, para conhecer lugares, deliciar-se com boa gastronomia, mas, acima de tudo, para valorizar as pequenas grandes coisas que estão disponíveis ao redor: as coisas simples e boas.

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