Uma vez li um texto que dizia que deveríamos olhar mais para o céu e menos para o chão enquanto caminhamos. Isso foi antes da febre dos smartphones (porque hoje em dia todo mundo caminha digitando alguma coisa). Eu costumo olhar bastante para o chão – porque gosto de olhar onde piso (metáfora que também rege minha vida). Mas tenho me policiado e tentado mirar mais o horizonte, fechar os olhos para receber o calorzinho do sol no rosto nas minhas andanças matinais com meu cão.
Faz alguns anos que, quando me pego caminhando e olhando para o chão, logo tento me corrigir: “Levanta a cabeça, Mariana!”. Teve uma vez que levantei a cabeça demais e deu no que deu. Eu havia acabado de me mudar para o Rio depois de não aguentar mais o estresse de São Paulo. Voltava do meu primeiro dia de trabalho na redação da revista IstoÉ Gente dirigindo meu Fox pretinho e novinho. Entrei no túnel Rebouças para sair do outro lado, na Lagoa. Tudo escuro, tudo escuro, tudo escuro e, de repente…. Fim do túnel! Céu azul, sol forte, árvores nativas e a linda Lagoa Rodrigo de Freitas.
– Ahhhh… – soltei um suspiro, enquanto pisava no acelerador. – Bem-vinda ao Rio de Janeiro, Mariana! – disse para mim mesma. – Olha lá o Cristo, que coisa mais linda… Abençoado seja.
Então, segui meu mantra de olhar pra cima e admirar o Cristo. Esqueci apenas que não estava caminhando, mas dirigindo. Quando voltei a olhar pra frente, era tarde demais. Um Monza azul calcinha estava parado bem na minha frente, preso em um engarrafamento que eu ainda não tinha visto porque preferi olhar o Cristo.
Freada, freada, freada, freada, freada, freada, freada e….. PUUUUM!!!! Amontoei o Monza azul calcinha e mais uns três carros na frente dele. Destruí com meu Fox pretinho e zerinho. Não sofri nenhum arranhão, o senhor do Monza e os outros motoristas também não. Acho que foi a bênção do Cristo.
Lembrei desse episódio hoje de manhã bem cedo, enquanto vinha para o plantão no jornal. Estava na Ipiranga, dirigindo e olhando pra frente, quando algo me chamou para desviar o olhar para a esquerda. A foto não retrata a beleza da cena que vi, mas eu fiz questão de bater do mesmo jeito. Não sei o nome desses pássaros, mas eles estavam em dezenas lagarteando em cima das árvores que cercam o Arroio Dilúvio. Pegando esse solzinho da manhã de sábado.
Tive que fazer a volta na Ipiranga e tornar a passar por ali. Tive que ligar o pisca-alerta na faixa da esquerda da Ipiranga, parar e fazer essa foto, que não tem close porque foi tirada com o iPhone. Tive que abrir a janela e perguntar:
– Ei, faceiras, querem bergamotas?
Sol de inverno, paz sobre as árvores e céu azul. A bergamota era só o que faltava para aquele programa estar completo.