Gloria Pires: talento gigante para administrar carreira, casamento e maternidade

Um dia intenso de gravação não tira o fôlego de Glória Pires nem na hora em que abre a porta de casa e encontra quase tudo fora do lugar.

– Há dias em que parece que passou um vendaval em casa. Tem sapato na sala, copo no banheiro, caderno dentro do armário, roupas que sumiram, maquiagem revirada.

Pouco importa para a supermãe de 52 anos de idade – 49 deles dedicados à arte de dar forma e alma a mais de três dezenas de personagens de novelas, filmes e minisséries.

A prioridade é beijar, abraçar, saber tudo sobre a rotina de sua numerosa família e, se sobrar tempo, abrir um livro antes de dormir.

– Hoje tenho mais maturidade para lidar com isso – minimiza.

Com simplicidade e quilometragem para criar filhos de quatro diferentes faixas etárias, a atriz transfere para segundo plano a complexa realidade de administrar uma casa cheia.

– Hoje consigo fazer vista grossa para essas coisas e realmente ir no foco da minha atenção, que é o Orlando e as crianças. Posso privilegiar meus filhos sem medo. O resto a gente dá um jeito. Poder estar com eles é o que realmente me traz tranquilidade e segurança.

gloria-perez-web-2GLORIA PIRES, 52 ANOS E 49 DE ATUAÇÃO: VIDA E OBRA SE MISTURAM

O entendimento de que compromissos aparentemente irremediáveis existem tanto na profissão quanto na vida pessoal lhe deram serenidade para saber priorizá-los sem remorso. Uma dessas prioridades é o caçula Bento, que veio concluir um desejo acalentado desde o nascimento da primogênita Cleo: ter quatro filhos. “Por que quatro?”, provoca ela, com aquele largo sorriso que dispensa apresentações. “Porque sempre achei quatro um número bonito”, responde. Bento nasceu em um momento de paz na vida de Glória Pires. A gravidez não teve nada de planejada. Nenhuma das quatro, aliás, foi assim.

– Nossos filhos não são planejados, mas desejados. São eles que escolhem a hora de chegar.

É uma crença que, de certa forma, serve de alento para os dois abortos espontâneos sofridos antes da gravidez do caçula – um golpe que ainda hoje Glória acusa com o olhar mareado.

“Ficamos com muito receio, frustrados, com medo. Mesmo que aquele ser dentro de você ainda não tenha forma, você cria uma série de expectativas. Imagina o rosto, o quarto, a roupinha. Então, a hora da perda é terrível, um negócio complicadíssimo.”

A chegada do filho veio sucedida de uma visita ao Mosteiro de São Bento, localizado no alto de uma colina em Brasília. Ainda abalada pela dupla perda, Glória dedicou alguns minutos para uma conversa particular com São Bento.

– Mas não pedi nada”, apressa-se em explicar. – Nunca fui de pedir nada em oração. Acredito que o que tem que acontecer, acontece. Naquela conversa, apenas me coloquei à disposição Dele para que, se estivesse na nossa história ter mais um filho – e se ele fosse homem –, se chamaria Bento.

Passados cinco meses, durante uma ultrassonografia de rotina para avaliar o estado do bebê, recebeu do médico a notícia. “É menino homem, viu?”, revelou ele. “Hein?!”, retrucou, Glória, incrédula. “É o quê? É menino?”, ela insistiu.

Orlando recorda cada detalhe da cena. “Foi uma loucura, realmente”, admite. “Um misto de contentamento, de agradecimento por merecer ter mais um filho e também por saber que era homem. É bacana porque, após três meninas, Bento chegou para mudar as brincadeiras e trazer uma nova coreografia para nossa casa. Ele movimenta o ambiente. Veio para arrebentar.”

O casamento de 31 anos com Orlando Morais serve de sustentação para a atriz. Orlando é o marido, o amante, o companheiro, o pai que guia seus quatro filhos, a voz e a opinião que garantem serenidade à atriz.

– Um cara de percepção incrível, a pessoa em quem mais confio para me orientar. É a ele que procuro, é com ele que me abro.

Coube a ele exercer o difícil papel de mediador entre o grito de independência da primogênita Cleo e o receio de Glória em aceitá-lo. Orlando resolveu com Cleo os detalhes do apartamento que serviria como a emblemática passagem da atriz para a vida adulta. Glória jamais se opôs ao bater asas da filha – “crio meus filhos para serem independentes” –, mas não nega a aguda dor de mãe experimentada.

“Foi um baque. Senti um corte, senti medo e saudade, tudo misturado. Chorei quatro dias, fiquei mal. O que vinha à minha cabeça era: ‘Será que eu ensinei o suficiente? Será que ela entendeu tudo? Será que ela vai saber se virar?’.”

Sessões de chakroterapia ajudaram a aliviar o sofrimento.

– Deu uma equilibrada. Acabei digerindo bem a história.

É com orgulho que assiste à explosão da filha na opção de perpetuar o nome da família na profissão. Cleo, segundo Glória, manteve o que considera essencial com a chegada irremediável da fama.

– Manteve as verdades e os prazeres dela. Convive naturalmente com o sucesso, o que leva Orlando e eu a perceber que fizemos um bom trabalho.

Lembra o boato disseminado há 20 anos – de que teria tentado suicídio após descobrir um suposto caso de amor entre o marido e a filha – para celebrar com mais entusiasmo ainda a trajetória ascendente da primogênita.

“Nossa união foi fundamental durante aquela crise horrorosa, um tsunami que não tinha nada a ver conosco. Orlando e Cleo sofreram muito ao serem julgados por algo que não aconteceu. Mas, graças a Deus, passou e estamos inteiros, felizes e com nossa filha encaminhada, honrando o nome dela.”

Glória e Orlando são cúmplices na doutrina que rege a educação da prole. Tanto para ela como para o marido, não existe convivência sem diálogo. O “não admito, filho meu não faz isso” está proibido dentro de casa. Glória se abre com os filhos e não teme exibir suas próprias fragilidades.

– É como se o seu filho não pudesse ter intimidade e proximidade com você porque acabaria descobrindo que você é humano, é fraco e também comete erros.

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Mari Kalil

Mari Kalil

Sou escritora, jornalista, colunista da Band TV e Band News FM e autora dos livros "Peregrina de araque", "Vida peregrina" e "Tudo tem uma primeira vez". Sou gaúcha, nasci em Porto Alegre, vivo em Porto Alegre, mas com os olhos voltados para o mundo. Já morei em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Barcelona. Já fui repórter, editora, colunista. Trabalhei nos jornais Zero Hora, O Estado de S.Paulo e Jornal do Brasil; nas revistas Época e IstoÉ e fui correspondente da BBC na Espanha, onde cursei pós-graduação em roteiro, edição e direção de cinema na Escuela Superior de Imagen y Diseño de Barcelona. O blog Mari Kalil Por Aí é direcionado a todas as mulheres que, como eu, querem descomplicar a vida e ficar por dentro de tudo aquilo que possa trazer bem-estar, felicidade e paz interior. É para se divertir, para entender de moda, de beleza, para conhecer lugares, deliciar-se com boa gastronomia, mas, acima de tudo, para valorizar as pequenas grandes coisas que estão disponíveis ao redor: as coisas simples e boas.

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