Sorvete da Poppi, crepes da Crêpas, humanos superiores, cão sufocado

Algumas coisas me tiram um pouco do sério. Poderia parar e agora e fazer uma listinha – desde falta de gentileza em geral a argentino mal criado (criatura esta, aliás, com quem estamos tendo que aprender a conviver nesta temporada em terra que nem é a dele). Sempre fui contra esta mania de brasileiro de torcer contra argentino e tal. Essa birra sem muita explicação. Continuo não tendo muita coisa contra argentino, mas contra o portenho… Contra esse ser altruísta que se julga superior ao resto da humanidade, este que reside em Buenos Aires…. Olha…. Como diz a Alemoa, minha amiga de Bagé, “tem que estar sesteado” para suportar.

mulher-arrancando-os-cabelosSÃO INSUPORTÁVEIS

O filme Relatos Selvagens não poderia ter sido feito em outro país que não na Argentina. Ele exemplifica de forma extremada o comportamento intolerante do portenho. O cidadão de Buenos Aires (claro, estou generalizando, lá habitam também boas almas) não consegue esperar na fila, não consegue andar atrás no trânsito, não entende que gentileza gera gentileza. Ele paira único no mundo – e o mundo e as pessoas do mundo existem para servi-lo, em sua umbilical concepção.

Mas não era sobre o portenho que queria falar, até porque não acordei masoquista nesta terça-feira. Queria falar sobre outra coisa que me tira do sério: vento. Sabe aquele vento que tira o norte da pessoa? Aquele que faz com que os cabelos fiquem indomáveis; os olhos lacrimejantes? Este é um vento típico aqui em Punta del Este. Hoje, por exemplo, venta bastante.

bento1122ELA FICOU QUASE LOUCA NA RUA

Saímos, Bento, Paqui e eu, para fazer o de sempre: aproveitar o passeio para comprar medialunas dulces para nosso café e o El País para ficar por dentro das notícias. Quase levantei voo. Os cabelos pareciam a hélice de um helicóptero desgovernado, Bento puxava para um lado, Paqui puxava para outro, a sacola de medialunas formava uma espécie de páraquedas e o jornal se desmantelava com folhas sobrevoando toda a extensão da Avenida Gorlero.

Chivito Canadense al plato, a banana split dos chivitos. Nham Nham!

Cheguei de volta em casa sem jornal e com uma cara de louca desvairada. Os animais, que na hora do passeio comportam-se como portenhos, ou seja, só querem saber de seu bel prazer, chegaram em casa exigindo o café da manhã. Latindo, gritando, dando mortal de costas de fome. Não bastasse eu ter que controlar uma Mariana mal humorada que havia se apossado subitamente de meu espírito por conta do desgraçado do vento, também tinha que domar dois animais escandalosos pela ração com pedaços de pollo.

bento1123ESTAVA COM DAS FOMES

manaELA NÃO DEU NOSSO JANTAR ONTEM

Pareço uma carrasca, vai dizer? Óbvio que não dei o jantar. Os dois encheram a barriga na praia. Estava um dia lindo em Punta na segunda-feira e decidimos pegar uma praia em Bikini, minha praia favorita na Brava (se é que posso ter predileção por algum tipo de praia, uma vez que não gosto de praia). Armamos acampamento com nossa geleira com água, cervejinha gelada, tomatinhos com azeite e orégano, que preparo a cada ida à praia para evitar comer besteiras – e ficamos até o pôr do sol.

Olha!

BENTO E PAQUI NA PRAIAMOMENTO BARRIGA CHEIA E SESTA NA PRAIA
Reparem, por favor, na cara de ambas as criaturas. Uma nem conseguia se levantar da areia; a outra teve que ser alçada e mesmo assim nem conseguia abrir os olhos. E eu só queria que eles admirassem la puesta del sol

Experimentei duas coisas que não havia experimentando até então: as Crêpas e o sorvete da heladeria Poppi. Primeiro, sobre o Poppi. A heladeria Poppi está localizada bem atrás aqui do prédio. Se a Arlecchino, minha sorveteria predileta, fica a uma quadra de distância, a Poppi nem isso. Fica logo ali atravessando a rua. Só que a gente nunca tinha experimentado o sorvete da Poppi. Passávamos batido pela Poppi, sempre meio vazia, e decidíamos entrar na fila enorme da Arlecchino. Uma bela noite, frio, vento, nós quatro parados na fila da Arlecchino, eu falei para o Chico:

– Acho que a gente deveria sair daqui agora e experimentar o sorvete da Poppi. Vamos ter nossa própria opinião a respeito se vale a pena mesmo encarar a fila da Arlecchino, se o sorvete da Poppi é tão aquém ao da Arlecchino, ou se as pessoas acabam vindo aqui porque tem fila, porque está virando famosinha e tal e nem pensam em dar uma chance para a Poppi. Vamos?
– Tu acha? – ele insistiu.
– Acho.
– Então vamos.

bento1123VAMOS

Conclusão: é óóóóótimo o sorvete da Poppi. Não deixa a desejar. Claro, não tem os mesmos sabores. Por exemplo, não tem o meu amado Montebianco, da Arlecchino. Mas eu amei o Dulce de Leche Tentación e o Chocolate Holandês (amargo). Tanto que acabamos voltando mais de uma vez e incluímos a Poppi no nosso roteiro de sorveterias.

woman-question21FALA SOBRE AS CRÊPAS, MARIANA

Sobre as Crêpas: há uns dois ou três anos atrás, surgiu a Crêpas, uma portinha ali em uma rua que é travessa da Gorlero. Foi um sucesso. Gente saindo pelo ladrão a qualquer hora do dia e da noite. Eles servem crepes para comer tipo sanduíche, sabe assim? E tem de todos os sabores, doces e salgados.

Olha!

CREOOOOOOOOHHHHH

nham-nhamNHAM NHAM!!

Há dois verões, quando Mami passou sozinha aqui na companhia de sua irmã, Chris, ela conta que as duas saíam da praia e iam direto ali almoçar. Que era uma delícia, que ela pedia o crepe Caprese, com tomate, rúcula e queijo e tal. Minha mãe é MUITO chata para comida, vive achando defeito em pratos e tal. No momento em que ela não parava de elogiar a tal Crêpas, eu pensei: “Preciso experimentar”. Só que demorou, mais precisamente dois verões.

Nesses dois verões, a Crêpas cresce e apareceu. Abriu mais uma loja na Barra e outra em Manantiales – que vivem lotadas. Assim sendo, domingo, saindo da praia de Bikini (que está localizada em Manantiales), resolvemos fazer um pit stop na Crêpas de lá e, enfim, provar.

enxaqueca21QUE MOMENTO

bento1123EU QUASE MORRI

Sentamos em uma das mesinhas, mas logo começou a chover e tivemos que nos refugiar na escadinha embaixo dos toldos. Praticamente sentados no chão. Havia movimento, mas não um súúúúúúper movimento. Leo e Ju estavam conosco. Leo foi comprar crepe de frutos do mar para a Ju (era este sabor, né, Ju?) e dois caprese – um para ele e outro para Chico e eu dividirmos, uma vez que não estava com muita fome.

O que aconteceu, então? Quando nosso crepe chegou, alguém surtou. Alguém, começou a berrar desesperadamente. Também queria crepe. Este alguém começou a tumultuar o ambiente. Este alguém deu para gritar por comida depois de velho.

bento1123ESTOU MAIS DOS INTOLERANTES

manaTIPO PORTENHO

Com a chuva caindo, nós todos refugiados embaixo do toldo junto com outras pessoas e um animal berrando e reivindicando um crepe para chamar de seu, eu resolvi por bem tirar um pedacinho e dar para ele. Pra quê? A massinha do crepe não estava croc croc croc. Por conta do movimento de clientes, acho que os funcionários estavam fazendo tudo meio às pressas – e a massa estava quase crua. Mole sabe, assim? Parecendo uma cola. Pois esta cola que o animal devorou como se não houvesse amanhã, colou no céu da boca do animal próximo à goela. E o animal começou a sapatear.

bento1123ACHEI QUE FOSSE MORRER SUFOCADO

Quando eu olho para o lado, entre uma mastigada e outra da minha crêpa, o animal está com os dois olhos esbugalhados, a boca meio aberta e tentando enfiar as duas patas dentro da goela. Aquele que era para ser um momento de happy hour, de confraternizacão, de provar, enfim, as famosas crêpas, virou um instante de SAMU. Chico e eu largamos tudo, levantamos o animal do chão. Um abria a boca dele, outro enfiava a mão dentro da goela. E o animal esperneava.

manaBENTO ADORA DAR SHOW

Alguns poucos minutos, que pareceram horas, se passaram. Até que o animal cuspiu aquela cola de crepe e ficou estaqueado olhando para a nossa cara, tentando entender o que havia acontecido. Levou dois esporros, claro, deitou-se e não encheu mais o saco.

bento1123FIQUEI DOS APAVORADOS

Não gostei muito do crepe por conta dessa massa mole e crua, sabe assim? Mas pode ter sido algo pontual (o que duvido um pouco, uma vez que o movimento nunca cessa, e eles devem fazer às pressas sempre). Mas vale experimentar. Só não deixe que seu cachorro surte você com pedidos e acabe dando um pedaço para ele, por favor. Foi atenção semelhante a esta que várias leitoras me fizeram quando eu disse que dava aquele ossinho branco para a Papaqui, que o ossinho era sua brincadeira favorita.

Olha!

PAPAQUIPAPAQUI EM MOMENTO DIVERSÃO COM O OSSINHO ASSASSINO

A Patricia Dalcin me mandou uma mensagem correndo com a notícia de que esses ossos, depois de muito mastigados, acabam virando uma cola parecida com a do crepe e estão sufocando e matando cachorros, sabiam? Eu não tinha ideia. Pois fiquem alertas. Na mesma hora, sumi com a brincadeira preferida da Papaqui.

manaPISADA DAS MÉDIAS

bento1123SE EU NÃO GANHO CREPE, ELA NÃO GANHA OSSO

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Mari Kalil

Mari Kalil

Sou escritora, jornalista, colunista da Band TV e Band News FM e autora dos livros "Peregrina de araque", "Vida peregrina" e "Tudo tem uma primeira vez". Sou gaúcha, nasci em Porto Alegre, vivo em Porto Alegre, mas com os olhos voltados para o mundo. Já morei em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Barcelona. Já fui repórter, editora, colunista. Trabalhei nos jornais Zero Hora, O Estado de S.Paulo e Jornal do Brasil; nas revistas Época e IstoÉ e fui correspondente da BBC na Espanha, onde cursei pós-graduação em roteiro, edição e direção de cinema na Escuela Superior de Imagen y Diseño de Barcelona. O blog Mari Kalil Por Aí é direcionado a todas as mulheres que, como eu, querem descomplicar a vida e ficar por dentro de tudo aquilo que possa trazer bem-estar, felicidade e paz interior. É para se divertir, para entender de moda, de beleza, para conhecer lugares, deliciar-se com boa gastronomia, mas, acima de tudo, para valorizar as pequenas grandes coisas que estão disponíveis ao redor: as coisas simples e boas.

3 Comentários
  1. Mariana, acho que a alta temporada realmente pode ter atrapalhado o crepe.. Estive em Punta antes do verão e este crepe é simplesmente maravilhoso.. Acho q deves insistir.. Bjo

  2. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk me diverti muito lendo as aventuras das férias em Punta!! Valeu pelas risadas do meu dia Mariana!! Graças a ti! Bjs

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