O que é, afinal de contas, felicidade? Um sentimento? Um estado de espírito? Um lugar? Uma realidade? Um sonho? Uma utopia? Sucesso? Sorte? Satisfação? Sentir-se realizado? Difícil definir esta palavra que significa tanto para nós. A felicidade pode ser algo extremamente individual, pode variar de sentido entre diferentes culturas, pode ter diferentes filosofias a seu respeito. Mas uma coisa a felicidade faz com todo ser humano: procurá-la. O que é, onde está e como alcançar a felicidade são questões que passam pela cabeça de todo mundo.
Um homem, missionário americano chamado Daniel Everett, diz ter encontrado não a felicidade em si, mas a língua da felicidade. Na década de 70, ele foi enviado para a Amazônia, na divisa de Rondônia, para levar a palavra de Jesus aos índios Pirahãs. Seu trabalho era disseminar conhecimento e, quanto mais se aproximava da tribo, mais queria, na verdade, aprender com os Pirahãs. Ele foi identificando as relações entre os índios, a relação com a natureza e com o mundo e descobriu algo muito valioso: uma língua incomum.
DANIEL EM UM MERGULHO NA AMAZÔNIA COM UM DOS ÍNDIOS DA TRIBO
A língua que os Pirahãs falavam não tem números, não tem cores. Nenhum índio sabia quantos filhos tem; mas sabia o nome de todos eles. Não sabiam quantas árvores existem perto das suas casas, mas conheciam cada uma por suas características. Se comunicavam cantando. Não tinham a menor noção do que é Deus ou algo superior, mas estavam em plena paz e tranquilidade. E o mais curioso: não conjugavam nem passado nem futuro. Os índios tinham uma dimensão completamente diferente de espaço e tempo, e, foi essa forma de se entender no mundo que produziu a língua dos Pirahãs: a língua da felicidade.
Uma língua é um sistema de signos estabelecido socialmente, uma forma de organizar o mundo. A língua que falamos revela nossos pensamentos, nossas emoções. A gramática dos Pirahãs mostrava que a tribo vivia no presente. E vivia feliz.
O MISSIONÁRIO DURANTE A PESQUISA
O missionário virou lingüista e pesquisou por três décadas a língua da felicidade. Levou seu trabalho para o mundo acadêmico e foi extremamente criticado. Daniel Everett criou uma verdadeira guerra no território da ciência, pois sua tese questionava princípios universais de todas as línguas do planeta, desenvolvidos por um dos homens mais citado no mundo científico: Noam Chomsky. O assunto se tornou tão interessante que virou documentário. Em The Amazon Code – The Grammar os Happiness é possível acompanhar os detalhes dessa história.
As pesquisas de Daniel Everett não foram levadas adiante. Ele também foi impedido de voltar à tribo. E o governo brasileiro iniciou um processo de alfabetização com os Pirahãs, de acordo com o documentário. De fato, não sabemos se é possível que exista essa língua, com as características descritas pelo ex missionário. Mas, sobretudo, essa história nos faz pensar: como estamos nos relacionando com o mundo, com as pessoas? Com que profundidade? Com que qualidade? Estamos presentes ou ausentes de nossas vidas?
A língua é, na verdade, uma metáfora de inúmeras possibilidades que temos de conjugar a vida. Nossas escolhas gramaticais mostram o quão perto ou quão longe estamos de ser fluentes em felicidade. Se podemos escolher as palavras, também podemos escolher ser feliz.
Se você se interessar pelo documentário, é só dar o play. Vale muito!
Lindo texto. Adoro esses
Que legal! Obrigada!